Há retângulos de alcatrão novo onde antes arderam carros. Mas as marcam ficam
Na Estrada Nacional 236-1, para sempre a Estrada da Morte, tenta-se apagar os rastos de cá por lá perdeu a vida
O fogo em Pedrógão acabou, ficou a destruição. Recomeçou a vida. A vida possível
s populações das aldeias de Góis, distrito de Coimbra, levantaram-se
esta quinta-feira com um cenário bem diferente daquele que enfrentaram
nos últimos dias. O sol estava escondido, mas desta vez não pelo fumo do
incêndio que se mantinha ativo desde sábado, mas por uma neblina densa
que começou aparecer ao princípio da noite e se manteve durante a
madrugada, ajudando em muito a arrefecer terrenos e a evitar
reacendimentos.
Pela primeira vez em muitos dias, quase que se podia dizer que estava frio.
Às 7H40, surgia a informação pela qual todos esperavam. Depois de mais uma noite passada a combater as chamas, o fogo estava finalmente controlado. A meio da tarde de quarta-feira, também o dramático incêndio de Pedrógão Grande tinha sido dado como extinto.
Na vila e nas estradas em volta, a azáfama de carros de bombeiros, do exército, do INEM, da GNR prossegue. O tempo é ainda de vigilância e prevenção, com centenas de homens no terreno. Mas a desmobilização já começou. Da Escola Básica de Góis já começaram a sair os carros de bombeiros que por estes dias estacionaram no recreio onde os alunos antes jogavam à bola. A cantina onde se prepararam as refeições para os bombeiros poderá também em breve voltar a servir almoços a crianças. Góis foi um dos concelhos onde o Ministério da Educação mandou suspender aulas, exames e testes dada a gravidade da situação vivida na região.
Saindo da vila pela EN2, a mais longa estrada nacional do país, logo se
veem milhares e milhares de árvores queimadas pelas chamas que ora
seguiam para o lado da Pampilhosa da Serra, ora se voltavam para
Arganil, ora cresciam em direção ao fogo de Pedrógão Grande. Chegou a
temer-se que os dois incêndios de juntassem. E se tal não chegou a
acontecer, a sensação que fica depois de percorrer a estrada de um ponto
ao outro é que pouco escapou. A paisagem oscila mais entre o negro e o
castanho pálido, escasseando o verde das folhas das árvores.
Na berma da estrada, próximo da povoação do Caniçal, uma equipa repõe
cabos de fibra e fios elétricos. Das cerca de dez casas daquela
povoação, resistiram menos de metade. É também por lá que para um carro
com bombeiros que tinham chegado na véspera, vindos da Galiza, para
reforçar o combate. Os mesmos que na quarta-feira tinham dado uma ajuda
preciosa ao realizarem uma operação de contrafogo, que impediu as chamas
de subirem até ao parque eólico das Mestras, não muito longe do posto
de comando onde diariamente se fizeram pontos de situação, diretos e
comunicados de responsáveis do Governo.
A operação de contrafogo é estranha, arriscada, mas eficaz. Munidos de uma espécie de lança-chamas em vez de extintores e aproveitando o sentido favorável do vento, os bombeiros de fardas amarelas e verdes iam pegando fogo a arbustos e árvores, que num ápice se transformavam em acendalhas gigantes e ajudavam a propagar as chamas. As mesmas que iriam travar as que avançavam vindas de baixo, impedindo que o fogo passasse mais uma estrada.
Uns quilómetros à frente, é a vez dos técnicos das Infraestruturas de Portugal substituírem os sinais de trânsito chamuscados. Repõe-se a seta da curva perigosa, o fim de proibição de ultrapassagem e segue-se caminho até a um dos pontos de paragem obrigatória para milhares de bombeiros de quase todo o país que foram ali chamados.
À porta do Café da Picha, já no concelhos de Pedrógão Grande, são dezenas de veículos e de bombeiros, portugueses e espanhóis, que aproveitam para descansar, tomar café, beber água, carregar os telemóveis usando a extensão elétrica que o dono do café ali pôs para que dia e noite pudessem usar. Clientes foi o que não faltou por ali desde sábado. “Nunca servi tanto café”, desabafa Zeca, que manteve o estabelecimento a funcionar no horário mais alargado que conseguiu. Porque “não ia fechar a porta a esta gente”.
A partir do desvio para a estrada municipal que vai dar a Castanheira de Pera e à trágica estrada nacional 236-1, o cenário torna-se mais devastador. De um lado e doutro, é uma imensidão de troncos negros e chão preto e cinzas, de onde continua a sair calor, horas e horas depois do fogo ter sido apagado ali. As placas com os nomes das terras estão totalmente queimadas.
Entrando na estrada onde morreram mais de 40 pessoas, aparecem os primeiros carros e carrinhas queimados. Os trabalhos de limpeza e reconstrução prosseguem. No asfalto, há retângulos de alcatrão novo onde antes estavam os carros que arderam no meio da estrada, apanhados pelo fogo que vinha dos lados e caía de cima. As marcas ficarão para sempre.
In Expresso
Pela primeira vez em muitos dias, quase que se podia dizer que estava frio.
Às 7H40, surgia a informação pela qual todos esperavam. Depois de mais uma noite passada a combater as chamas, o fogo estava finalmente controlado. A meio da tarde de quarta-feira, também o dramático incêndio de Pedrógão Grande tinha sido dado como extinto.
Na vila e nas estradas em volta, a azáfama de carros de bombeiros, do exército, do INEM, da GNR prossegue. O tempo é ainda de vigilância e prevenção, com centenas de homens no terreno. Mas a desmobilização já começou. Da Escola Básica de Góis já começaram a sair os carros de bombeiros que por estes dias estacionaram no recreio onde os alunos antes jogavam à bola. A cantina onde se prepararam as refeições para os bombeiros poderá também em breve voltar a servir almoços a crianças. Góis foi um dos concelhos onde o Ministério da Educação mandou suspender aulas, exames e testes dada a gravidade da situação vivida na região.
O fogo isolou populações, tirou-lhes a luz e as comunicações. Há quilómetros de ligações para repor
A operação de contrafogo é estranha, arriscada, mas eficaz. Munidos de uma espécie de lança-chamas em vez de extintores e aproveitando o sentido favorável do vento, os bombeiros de fardas amarelas e verdes iam pegando fogo a arbustos e árvores, que num ápice se transformavam em acendalhas gigantes e ajudavam a propagar as chamas. As mesmas que iriam travar as que avançavam vindas de baixo, impedindo que o fogo passasse mais uma estrada.
Uns quilómetros à frente, é a vez dos técnicos das Infraestruturas de Portugal substituírem os sinais de trânsito chamuscados. Repõe-se a seta da curva perigosa, o fim de proibição de ultrapassagem e segue-se caminho até a um dos pontos de paragem obrigatória para milhares de bombeiros de quase todo o país que foram ali chamados.
À porta do Café da Picha, já no concelhos de Pedrógão Grande, são dezenas de veículos e de bombeiros, portugueses e espanhóis, que aproveitam para descansar, tomar café, beber água, carregar os telemóveis usando a extensão elétrica que o dono do café ali pôs para que dia e noite pudessem usar. Clientes foi o que não faltou por ali desde sábado. “Nunca servi tanto café”, desabafa Zeca, que manteve o estabelecimento a funcionar no horário mais alargado que conseguiu. Porque “não ia fechar a porta a esta gente”.
A partir do desvio para a estrada municipal que vai dar a Castanheira de Pera e à trágica estrada nacional 236-1, o cenário torna-se mais devastador. De um lado e doutro, é uma imensidão de troncos negros e chão preto e cinzas, de onde continua a sair calor, horas e horas depois do fogo ter sido apagado ali. As placas com os nomes das terras estão totalmente queimadas.
Entrando na estrada onde morreram mais de 40 pessoas, aparecem os primeiros carros e carrinhas queimados. Os trabalhos de limpeza e reconstrução prosseguem. No asfalto, há retângulos de alcatrão novo onde antes estavam os carros que arderam no meio da estrada, apanhados pelo fogo que vinha dos lados e caía de cima. As marcas ficarão para sempre.
In Expresso
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