quarta-feira, 25 de julho de 2018

Grécia. “Um homem contou-me ter visto uma rapariga subir a um penhasco para escapar às chamas. Caiu e morreu à frente dele”

Maria Papavlachou, jornalista do canal televisivo grego “Alpha TV” já só viu as pessoas chegarem de barco ao porto de Rafina, na Grécia, “a chorar, com frio e muito assustadas”, resgatadas de zonas a arder pela guarda costeira, pescadores e outros voluntários. Mas, ao falar com algumas delas, percebeu o que haviam passado até chegar ali. Houve mães que “se viram aflitas para segurar os filhos nos braços enquanto tentavam ao mesmo tempo manter-se à tona” e pessoas que “ficaram dentro de água durante quatro horas, à espera de ser resgatadas”. Mas há mais. Leia o testemunho de Maria Papavlachou sobre aquilo a que assistiu numa tragédia que provocou pelo menos 74 vítimas mortais:

Vi vários barcos a chegar ao porto de Rafina na terça-feira de madrugada. Traziam pessoas que estavam em risco e que a guarda costeira, pescadores e outros voluntários haviam resgatado em praias perto de Rafina, como Kokino, Limanaki e Mati. O primeiro barco que vi chegar trazia um homem com queimaduras por todo o corpo. As equipas de socorro tentaram tirá-lo dali o mais rápido possível porque ele estava em grande sofrimento. O segundo barco transportava sobretudo crianças e idosos, mas também um homem que se afogara. Foi a primeira pessoa morta a chegar ao porto.

Vi outros barcos chegar depois disso, com pessoas muito assustadas, com frio e a chorar, sobretudo os mais novos. Muitas delas traziam no corpo apenas a roupa de dormir porque o fogo chegou muito rápido às suas casas e não tiveram tempo para se vestir nem para pegar nas suas coisas, dinheiro, nada. Em dez minutos, viram-se rodeadas de chamas. Limitaram-se a fugir e a correr na direção do mar para se salvar. Houve quem, no entanto, mesmo estando já na praia, decidisse pegar no carro para tentar fugir, mas foi má ideia.
A estrada encheu-se de carros, uma fila enorme que não permitia a ninguém avançar. Essas pessoas acabaram por deixar os seus carros e correr para a praia. Algumas pessoas disseram-me ter visto corpos no chão, entre eles o corpo de um bebé, enquanto corriam na direção do mar. Um homem disse-me ter visto crianças no cimo de um penhasco a tentar chegar ao mar. E outro homem contou-me ter visto uma rapariga também a subir a um penhasco. Quando chegou ao cimo, caiu e morreu à frente dele.

Na água, muitas mães viram-se aflitas para segurar os filhos nos braços e evitar que se afogassem, enquanto tentavam elas próprias manter-se à tona. Imagino o sofrimento que terá sido para elas ficar ali, sem saber o que fazer. Houve pessoas que ficaram dentro de água durante quatro horas, à espera de serem resgatadas. Vi o alívio no rosto de muitas delas ao chegarem ao porto. Sentiam-se finalmente seguras, embora continuassem a chorar. Abraçavam-se entre si e choravam. Muitas delas tinham vindo em barcos diferentes e era em Rafina que voltavam a encontrar-se.

Também vi pais a percorrer o porto de uma ponta à outra, várias vezes, verificando em cada barco se o seu filho estava ali. Mati é uma zona balnear, tem muitas casas de férias, e alguns destes pais haviam deixado os filhos ali com os avós. Quando o fogo começou, não conseguiram obviamente deslocar-se até lá para ir buscá-los, sendo obrigados a esperá-los no porto de Rafina. De cada vez que chegava um barco, lá iam eles a correr à procura dos filhos. Foi assim até às quatro da manhã, hora a que pararam de chegar barcos ao porto.

In Expresso